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quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Piano na Sé. Uma idéia, um caminho e a solução.

http://www.youtube.com/watch?v=LwoRJrgRw6Q&feature=player_embedded
(metrô Sé em 02/08/2011) 



http://www.youtube.com/watch?v=shhCchHsbUA 
(aqui o mesmo jovem no metrô Santana em data anterior) 


Ontem foi um dia muito longo. Após 12 horas de plantão, sai às 7h20  do meu trabalho. Cheguei em casa às 8h15, mas só consegui pegar no sono por volta das 10h da manhã e às 13h já havia acordado. Estava ansiosa, pois tinha uma série de coisas para fazer. E seria, também, meu primeiro dia de aula de inglês a começar às 18h30. Sabia que se pegasse no sono profundo  poderia perdê-la.
Embora me sentindo muito, muito cansada enfrentei mais uma corrida  de metrô,  lotado,  de fim de tarde rumo à estação Sé. Encontrei-me com meu filho que fará  aulas comigo. Seu corpo, seu rosto refletia o estresse e o baque de um longo dia, uma longa jornada numa universidade em que trabalha.
A aula foi bastante proveitosa. A professora é animada e tem uma excelente didática. Por algum tempo esquecemos o quanto queríamos estar de pijamas sentados no sofá de casa.
Bem, a aula terminou e rumamos à estação Sé do metrô como que carregados pelo desejo sobre-humano de chegarmos ao nosso lar. No caminho,  as ruas escuras  e sujas, pessoas moribundas, outras nem tanto, enfileiradas para receberem uma porção de sopa, talvez seu único alimento do dia, graciosamente oferecida por um grupo de uma instituição religiosa. A situação mostrava claramente  o desmazelo do poder público em cuidar melhor de sua sociedade. Depois disso, certamente, cada um  procuraria  um canto nas calçadas  para se acomodar e alí passar sua noite. Triste, muito triste. Eu sabia que o meu cobertor juntamente com uma caneca de leite quente me esperava e,  para àqueles apenas um papelão, folhas de jornal ou um farrapo de pano os aguardava.
Chegando ao metrô, ainda com aquela cena em mente, fui subitamente envolvida por uma sonoridade agradável que contrastava com o ruído agudo dos trilhos do trem. Era um jovem rapaz, que mais parecia um skatista, um grafiteiro, menos um pianista. Eu e meu filho paramos por alguns minutos, suficientes para escutá-lo tocar Billionaire (Bruno Mars) e, em seguida,  Firework (Katy Perry). Dedilhava cada nota com tamanha habilidade e destreza que facilmente poderia nos presentear, algum dia, com “Clair de Lune”, de  Debussy ou ”Moonlight Sonata” de Beethoven. Olhando aquele rapaz, lembrei-me de um artigo que havia lido no dia anterior sobre o envolvimento de crianças,  adolescentes e jovens com a criminalidade. Esse rapaz, pianista anônimo na praça da Sé, foi agraciado com a oportunidade de aprender a tocar um instrumento. Provavelmente, seus olhos, seus sentidos percebem a vida de uma forma muito diferente de outros que com a mesma tenra idade foram empurrados para o lado negro da sociedade. Pois a arte nos engrandece, nos leva a outras dimensões. Aguça nossa criatividade, adoça a nossa forma de encarar a vida.
Fiquei pensando: o que falta para que o Estado perceba que a sociedade somente será salva se dedicarmos respeito aos nossos jovens? E que tipo de respeito é esse?  
É darmos uma educação de qualidade. Inserirmos,  desde cedo,  a “ARTE”  nas grades curriculares de nossas crianças. Seja plástica, cênica, literária ou musical. O Brasil é um país artístico. É de Di Cavalcanti, Tarsila do Amaral, Rinaldo Silva; de Grande Otelo, Oscarito, Paulo Autran, Marília Pera , Fernanda Montenegro; de Carlos Drummond, Mário Quintana, Cecília Meireles; de Cartola, Pixinguinha, Tom Jobim, Chico Buarque, Sivuca. E mais centenas de nomes, aqui, impossíveis de elencar.  A ‘ARTE’ está em  nossas entranhas, bastando somente estimular para que ela insurja.
Então, caríssimo anônimo pianista da estação Sé, meus parabéns. Bravo! Bravo! Você é o maior e melhor exemplo do que seria uma sociedade de jovens abastados de riqueza artística. Provavelmente com cidadãos  mais conscientes, independentes, intelectualizados e com senso crítico  mais  apurado.
Enfim, a solução nós temos. O caminho conhecemos.  É necessário apenas que os detentores do poder o usem para o bem comum, para a coletividade.

Tânia Alencar, funcionária pública, plantonista, mãe e cidadã em busca de uma sociedade melhor.